sábado, junho 10, 2006

Sonic Youth

O que é a maturidade? Hoje, na Praça Camões (sempre pensei que fosse um largo, por se dizer "O Camões"), uns quantos boneheads estavam reunidos para celebrar o 10 de Junho. Aquele tipo do PNR que tem um bigode ou um bigode uma pêra e que parece ser dos tipos mais ridículos de sempre, o tipo que diz que a segurança é mais importante que a liberdade mas invoca a liberdade para poder dizer as barbaridades que diz, estava lá a discursar.
Esta gente hoje em dia diz que é muito respeitadora e só faz manifestações pacíficas, mas um tipo qualquer estava prestes a ser espancado, e teria sido se a polícia não estivesse lá. "Este gajo espancou um amigo há duas semanas!", diziam eles, ou algo parecido. E, referindo-se à cor da pele do polícia a quem o tipo se tinha dirigido, "só estás protegido ao pé dos macacos", "quando te apanharmos matamos-te".
Têm mais 10 anos, no mínimo, que eu, idade para ter juízo, mas quando se junta um intelecto superior ao consumo exagerado de cerveja e a assistir-se a demasiados jogos de futebol dentro das claques onde se espanca o adversário porque é de um clube diferente (faz tanto sentido quanto odiar o próximo porque é de um país diferente, e sentir orgulho exacerbado e violento no próprio país porque é aquele onde se nasceu). Será que são maduros?
Não sou adulto, não me parece que alguma vez vá ser, mas é suposto esta gente ser adulta. O tipo do PNR tem mais de 30 anos, veste camisa e gravata, não é suposto ser adulto? Quando passei por eles, tinha acabado de comprar o Rather Ripped. Supostamente ainda não saiu, mas já está à venda numa certa loja de origem francesa, como aconteceu, por exemplo, com o Feels dos Animal Collective no ano passado. É capaz de ter acontecido com outros discos, mas não estou a ver nada agora. Hoje em dia já não interessa muito a data de saída dos discos, não tanto quanto há 10 anos, ou há 20, quando a data de saída era uma celebração.
De qualquer forma, dizem que os Sonic Youth são maduros, atingiram a maioridade. Faz sentido, têm todos mais de 40 anos, são pais, filhos, vestem-se de forma mais ou menos respeitável (o Lee Ranaldo aparece em muitas fotografias promocionais, e no próprio disco, de camisa e gravata). Musicalmente, têm muito menos tendência para explodir em milhentos pedaços de puro barulho a meio das canções (e quando o fazem parecem muito mais disciplinados, mais uma vez, que há 10 e 20 anos), estão muito mais melódicos e mais pop. O Thurston Moore é fã de Be Your Own Pet, uma banda convencional de acordo com os padrões de hoje, que soaria fresca há uns 20/30 anos, o que poderia significar algo, mas não significa muito. Ainda é um dos responsáveis da Ecstatic Peace, ainda toca de vez em quando com os Sunburned Hand of the Man como Sunburned Hand of Thurston, e continua a ser como um mecenas da cena underground. O Lee Ranaldo ainda tem discos chatos de improvisação livre na guitarra, o próprio Moore também toca em discos desses, etc.
A capa de Rather Ripped é feia, mas lá dentro escondem-se muitas óptimas canções, e até a do Lee Ranaldo soa estranhamente pop. Ainda nenhum deles sabe cantar a sério, mas as suas vozes estão melhor do que nunca, especialmente a da Kim Gordon. É viciante e orelhudo (odeio esta palavra, prefiro o inglês catchy) ao mesmo tempo, com guitarras ultra-melódicas, refrões onde se repete uma única palavra, mas sempre com estruturas não muito convencionais onde há espaço para passagens instrumententais óptimas que nunca se tornam cansativas, só há um verdadeiro freak-out digno desse nome, em "Turquoise Boy", mas muito controlado e estruturado, e as dissonâncias e os arranhões nas guitarras estão em segundo plano, muito ao de leve. Há espaço para folk na última faixa (ainda há uma bónus), com guitarras acústicas e com a melhor pergunta de sempre para acabar um disco: "Which came first? The music or the words?", mesmo que o venha antes não seja grande coisa (perguntas a bandas e histórias de tournées, algo que não interessa a mais ninguém a não ser à própria banda). Mas os Sonic Youth fazem isto com uma perna às costas, melhor do que ninguém, e é isso que faz deles uma das melhores e maiores bandas do mundo. Sente-se a falta de Jim O'Rourke, mas mais em termos de produção do que qualquer outra coisa, a banda funciona perfeitamente - como sempre funcionou até ele aparecer - como um quarteto. E agradecem-lhe no booklet, por isso ele voltar não parece estar assim tão fora de questão quanto isso.
Talvez seja este o som da maturidade, o som de gente a entrar na casa dos 50 já bem instalada e sem paciência para grande experimentação. Mas não é, eles ainda sabem fazer aquelas coisas esquisitas que sempre fizeram, os dias de hoje é que são mais propícios a uma separação entre a componente experimental e a componente pop. Não sou adulto, não sou maduro, não me parece que alguma vez vá sê-lo no verdadeiro sentido da palavra, mas se este é o som da idade adulta, tenho muito por que esperar se ela alguma vez chegar.

3 comentários:

Fabiana disse...

Sei que não é são os mesmos dos tempos áureos, mas não achei o disco nada mau...

O Puto disse...

Estou bem impressionado, para já.
A idade adulta não se mede em anos.

Anónimo disse...

Meu Deus, és um completo imbecil.