Nesta pérola de vídeo, Alberto Gonçalves fala-nos do melhor da década que passou. Em termos musicais, fala-nos Stephin Merritt (dos Magnetic Fields, que, apesar do conservadorismo, até reconhece que a produção dos Bomb Squad para os Public Enemy é importantíssima, isto numa lista de canções mais importantes do século XX, uma por ano) e Nellie MacKay (esta última não existiria sem o rap, o "ruído" de que Alberto Gonçalves tanto fala). E, melhor ainda, explica: "Na televisão gostei de Friends e Frasier, as sitcoms que infelizmente parecem ter presidido ao enterro do género. Gostei menos dos Sopranos do que das possibilidades narrativas e estéticas que Os Sopranos abriram e que hoje se notam em produtos como o House, um vício de que não abdico." Em suma: "eu não vi televisão nos anos 2000". As "possibilidades narrativas e estéticas de Os Sopranos" é uma frase bonita que não diz muito. O que é que House tem a ver com aquilo? Será a importância dos sonhos, algo que vem do Twin Peaks? E que dizer de um tipo que destaca de uma década inteira de televisão Friends e Frasier (séries que, aliás, começaram nos anos 90)? Estamos a falar de uma década óptima, em que as "possibilidades narrativas e estéticas" foram abertas de uma maneira até então inimaginável. Estamos a falar da década de Arrested Development, e o gajo fala-me de Friends e Frasier. Nada contra, a não ser o facto de eu já não ter dez anos e ser preciso um bocadinho mais do que o mínimo necessário para me fazer rir (não que não me ria de vez em quando com aquilo). O mundo de Alberto Gonçalves é um mundo cinzento e conservador. O senhor gosta de destacar que foi a Nova Iorque e viu Stephen Sondheim na Broadway, que conviveu com ele e que viu o filme do Tim Burton baseado nele. Podia ter ido a Brooklyn ou ao Bronx, mas não foi, porque são sítios em que quase toda a gente fez as escolhas erradas de vida. Podia ter vivido a cidade, usufruído das vistas, das pessoas, mas isso já tinha feito em DVD e corria sempre o risco de encontrar gente com opções duvidosas de vida. Também diz que Gran Torino não traz grande novidade, mas isso é quase um pleonasmo: Alberto Gonçalves não gosta nem da diferença nem da novidade. O mundo de Alberto Gonçalves é um mundo onde não há qualquer fascínio nem gosto pelo novo e o desconhecido, onde as escolhas certas e mais óbvias são as únicas possíveis, ignorando o essencial: tudo o que é hoje em dia canónico já foi um dia novo e desconhecido ("no shit, Sherlock!", aposto que não fazias ideia disto e acabaste de descobrir porque eu escrevi). O mundo de Alberto Gonçalves é um mundo onde eu não quero, de todo, viver.
1 comentário:
E aí vão 3... bonito, bonito seria se esse senhor lesse estas coisas!
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